Gaguez nos ouvidos da sociedade

Não tem passado despercebida a ninguém, a polémica em volta da deputada Joacine Katar Moreira, o que me lançou numa reflexão mais aprofundada acerca do conceito “inclusão”. Enquanto Terapeuta da Fala integrei desde cedo o conceito. Contudo, enquanto profissional, que trabalha há mais de 10 anos na área da gaguez, tenho sentido que o mesmo não é transversal a todas as áreas e desconfio até que existe algum desconhecimento na nossa sociedade sobre o profundo significado de “integrar”. Numa busca rápida acerca da definição do termo “inclusão” encontramos informações como: “Inclusão social é oferecer oportunidades iguais de acesso a bens e serviços a todos”.

Apesar de compreender o desconforto e incómodo que algumas pessoas sentem quando ouvem alguém gaguejar, entristece-me perceber que para muitos a resolução deste “problema”, está em calar uma voz. Este pressuposto transborda egoísmo por todos os lados e é totalmente contraditório com aquilo que se pretende de uma sociedade inclusiva. Será que este incómodo e este desconforto estão relacionados com o facto de a sociedade estar pouco habituada a ouvir pessoas que gaguejam? Estará a sociedade distraída e surpreendida com a forma como se gagueja e pouco focada no conteúdo da mensagem? Talvez a sociedade portuguesa necessite de mais pessoas como a deputada Joacine que nos façam refletir de forma séria acerca da condição de gaguejar. Espero sinceramente que outros apareçam e mostrem que também têm o direito de falar, mesmo que demorem mais tempo para o fazer. Quem gagueja também tem o direito de ter uma voz ativa. Quem gagueja tem o direito de gaguejar. Quem gagueja também tem o direito de não gaguejar e poder ser fluente de vez em quando. Esta variabilidade gaguez versus não gaguez na mesma pessoa, que tanta polémica tem trazido para as redes sociais, insere-se na definição de gaguez. Quem gagueja não está 24 horas a gaguejar e sim pode ter períodos de fluência total. O controlo sobre estas questões nem sempre é fácil e pode trazer uma frustração inimaginável para a pessoa. Este artigo de opinião está longe de ter interesses políticos. Este artigo é escrito por alguém que trabalha diariamente com pessoas que gaguejam e que faz um apelo para que aqueles cujas palavras saem sem esforço tenham uns minutos de reflexão, acerca do assunto, e desenvolvam alguma empatia por todas as pessoas que gaguejam.

A Terapia da Fala é essencial no trabalho com as perturbações da fluência mas a mudança de mentalidades na nossa sociedade também!

Terapeuta da Fala
Mónica Rocha
Especialização em perturbações da fluência (gaguez)

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